Desenvolvido na rede Mass General Brigham, impacto foi observado em maior proporção em meninos e quando a infecção acontece no fim da gravidez.
Durante a pandemia, gestantes sempre estiveram entre os grupos que exigiam atenção especial. Sabia-se que a covid-19 poderia aumentar riscos obstétricos, mas pouco se conhecia sobre seus efeitos no cérebro e no comportamento das crianças. Agora, um estudo que analisou mais de 18 mil traz novas evidências de que a infecção pelo vírus SARS-CoV-2 durante a gravidez pode ter impacto duradouro no início da vida.
Conduzida pela Mass General Brigham, uma das maiores redes hospitalares de ensino dos Estados Unidos — que inclui o Massachusetts General Hospital e o Brigham and Women’s Hospital — , ambos afiliados à Harvard Medical School, a pesquisa acompanhou crianças do nascimento até os 3 anos.
O trabalho identificou que os filhos de mães infectadas durante a gestação apresentaram maior frequência de diagnósticos de Transtornos de Neurodesenvolvimento. O risco foi mais elevado entre meninos e nos casos de infecção no último trimestre da gravidez.
Os Transtornos de Neurodesenvolvimento são condições que afetam a forma como o cérebro se forma e amadurece. Eles podem comprometer habilidades como fala, aprendizagem, atenção, controle motor e interação social.
Surgem quando algo interrompe o desenvolvimento normal do sistema nervoso, o que pode ocorrer por causas genéticas, exposição a substâncias tóxicas, falta de oxigênio durante a gestação ou infecções virais, como a covid-19. Entre os exemplos mais conhecidos estão autismo, TDAH, dificuldades de aprendizagem, atrasos de fala, além do transtorno intelectual do desenvolvimento e de síndromes como a de Tourette.
Como o estudo foi feito
A equipe analisou dados de 18.124 nascimentos entre março de 2020 e maio de 2021. Desse total, 861 gestantes (4,8%) testaram positivo para covid-19. Os pesquisadores compararam registros médicos e diagnósticos entre os grupos, observando a incidência de Transtornos de Neurodesenvolvimento nos primeiros 36 meses de vida, com base em códigos internacionais (CID10).
Modelos estatísticos ajustaram fatores como idade materna, raça, tipo de parto e prematuridade. Os resultados mostraram que 16,3% das crianças expostas ao vírus receberam algum diagnóstico desse tipo até os 3 anos, contra 9,7% entre as não expostas. A associação foi considerada estatisticamente significativa (aOR 1,29; IC 95% 1,05–1,57) e mais forte em meninos (aOR 1,43). Casos de infecção no terceiro trimestre apresentaram o maior risco (aOR 1,36).
Esses achados reforçam que os estágios finais da gestação são períodos críticos para a formação cerebral e que exposições adversas nesse momento podem aumentar a vulnerabilidade ao desenvolvimento de transtornos infantis.
O que muda para famílias e gestantes
Para famílias e profissionais de saúde, o estudo indica a importância de monitorar de perto o desenvolvimento de crianças cujas mães tiveram covid-19 durante a gravidez — especialmente nos casos de infecção no final da gestação e em meninos.
O acompanhamento clínico precoce pode ajudar a detectar sinais de atraso e garantir intervenções terapêuticas e educativas mais eficazes. Para gestantes, os resultados reforçam o papel da vacinação e das medidas preventivas contra o vírus. Proteger a saúde materna é também proteger o desenvolvimento neurológico do bebê.
Incertezas e próximos passos
Apesar da robustez da amostra e da metodologia, ainda não se sabe se os efeitos observados persistem após os 3 anos ou se variam conforme a gravidade da infecção e as variantes do vírus. Os autores lembram que se trata de uma associação observacional, e não de uma relação causal comprovada.
Eles também destacam que fatores externos, como o ambiente familiar, o acesso à estimulação cognitiva e a qualidade do cuidado infantil, podem influenciar os resultados. “O acompanhamento contínuo será essencial para avaliar a durabilidade e a relevância clínica dessas alterações precoces”, afirmam os pesquisadores.
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[Leia o artigo original]
Neurodevelopmental outcomes of 3-year-old children exposed to maternal severe acute respiratory syndrome coronavirus 2 (SARS-CoV-2) infection in utero
Lydia L. Shook, Victor Castro, Laura Ibanez-Pintor, Roy H. Perlis, Andrea G. Edlow
Obstetrics & Gynecology, 2025. Mass General Brigham, Boston (EUA)
DOI: 10.1097/AOG.0000000000006112
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Texto: Marcus Vinicius dos Santos – jornalista CTMM Medicina UFMG