Um estudo do grupo de pesquisa MIND, dos EUA, buscou entender quais comportamentos influenciam os sintomas de autismo. Por exemplo, por que meninas com autismo desenvolvem mais habilidades sociais? Além de reforçar a necessidade de considerar as diferenças de gênero nos estudos sobre esse transtorno do neurodesenvolvimento, a publicação do artigo no mês de abril também cumpre função de aumentar a conscientização sobre a realidade dessas pessoas.
O autismo é um transtorno do neurodesenvolvimento, caracterizado por desafios na comunicação e comportamentos restritos ou repetitivos. Esses sintomas variam em gravidade e podem mudar ao longo da infância. Estudos mostram que as meninas tendem a apresentar maior redução na severidade dos sintomas, com o passar dos anos.
Estamos em abril, o Mês Mundial de Aceitação do Autismo, e a revista da Sociedade Nacional de Autismo do Reino Unido publicou um artigo que reforça a importância de que essas diferenças entre meninos e meninas sejam mais valorizadas e exploradas.
No estudo conduzido pela psicóloga Einat Waizbard e sua equipe, da Universidade da Califórnia Davis, foram analisados dados de 183 crianças com autismo, dentre elas 55 meninas, 30% dos participantes. Todas, integrantes do Autism Phenome Project (APP), vinculado ao Instituto MIND, da Universidade da Califórnia, assim como também integrantes do projeto Girls with Autism Imaging of Neurodevelopment (GAIN), liderado pela neurocientista Christine Wu Nordahl.
Os pesquisadores analisaram dados comportamentais, exames de neuroimagem e testes cognitivos de crianças e adolescentes com TEA. Por conseguinte, foram comparados padrões de interação social, respostas emocionais e habilidades comunicativas ao longo dos anos.
Mais tendências, menos agravamentos
Pesquisas anteriores já indicavam que meninas autistas apresentam maior redução na gravidade dos sintomas ao longo da infância. Além disso, existe menor probabilidade de agravamento no mesmo período. Portanto, segundo os autores, isso se deve tanto à maior tendência a melhorar, que as meninas têm, quanto a uma menor propensão ao agravamento.
Esse padrão contrasta com o dos meninos, que apresentaram maior variabilidade: alguns melhoram, enquanto outros pioram ao longo do tempo
Habilidades sociais como fator de melhora
O estudo mostrou que meninas com autismo desenvolvem mais habilidades sociais. Em outras palavras, o engajamento social e a resposta positiva a outras pessoas foram responsáveis por grande parte das melhorias nos sintomas. A saber, as meninas interagem mais. Como resultado, elas demonstram maior capacidade de compartilhar momentos de alegria e reciprocidade social.
Avanços em habilidades sociais essenciais — não apenas como manter contato visual, compartilhar emoções, como também responder com mais consistência às interações — foram destacados como fundamentais do ponto de vista social.
Diferenças no diagnóstico e camuflagem social
O diagnóstico de autismo é mais frequente em meninos, com uma estimativa de três casos no gênero masculino para cada um no feminino. Os cientistas, no entanto, acreditam que esse desequilíbrio possa ser um reflexo da predominância de trabalhos realizados com populações majoritariamente masculinas.
Foi observado que muitas meninas desenvolvem estratégias para mascarar suas dificuldades sociais, ao que os especialistas chamaram de “camuflagem social”. E essa capacidade de adaptar-se, por sua vez, pode dificultar o diagnóstico entre meninas, já que seus desafios tornam-se menos evidentes em avaliações tradicionais.
Um outro achado relevante envolve subgrupo de meninas com sintomas graves aos três anos de idade. Embora elas tenham apresentado melhorias significativas nos anos seguintes, essas mudanças nem sempre resultaram em melhores resultados em comparação com outras meninas.
Comportamentos que influenciam sintomas de autismo em meninas
Comportamentos | Descrição |
---|---|
Maior engajamento social | As meninas autistas tendem a interagir mais, demonstrar reciprocidade social e compartilhar momentos de alegria com os outros. |
Melhora na resposta social | Elas desenvolvem mais habilidades para manter contato visual, expressar emoções e responder de maneira consistente às interações sociais. |
Menor variabilidade nos sintomas | Enquanto os meninos apresentam trajetórias mais diversas (com alguns melhorando e outros piorando), as meninas, em geral, mostram uma tendência mais estável de progresso. |
Maior desenvolvimento em habilidades sociais | Algumas meninas, mesmo com sintomas graves aos três anos, apresentam avanços significativos nos anos seguintes. |
Diagnóstico e tratamento precisam considerar o gênero
Embora muitas meninas apresentem progresso significativo, algumas ainda enfrentam desafios. Entre eles, dificuldades linguísticas que impedem sua avaliação em módulos mais avançados do Protocolo de Observação para Diagnóstico de Autismo (ADOS). Em síntese, esse protocolo é um dos mais utilizados no diagnóstico do transtorno.
O estudo reforça que a melhora deve ser medida pelo progresso individual, não apenas pelos escores gerais de sintomas. Compreender essas trajetórias pode ajudar a melhorar diagnósticos e tratamentos. Meninas com autismo desenvolvem mais habilidades sociais, mas têm padrões de desenvolvimento diferentes, não considerar as diferenças de gênero no autismo poderia levar ao subdiagnóstico de meninas.
Logo, considerar mudanças específicas no comportamento, em vez de focar apenas na severidade global dos sintomas pode ajudar a aperfeiçoar os métodos de identificação precoce e melhorar as intervenções para crianças autistas.
NeuroTec-R e a pesquisa em neurodesenvolvimento
O Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Neurotecnologia Responsável (NeuroTec-R) contribui para pesquisas em neurodesenvolvimento. De acordo com as diretrizes de Pesquisa e Inovação Responsável (PIR), o NeuroTec-R incentiva a participação da sociedade, cientistas, setor público e privado. O objetivo é desenvolver soluções mais inclusivas para diagnóstico e intervenção precoce no autismo.
Leia o artigo original
Trajectories of Autism Symptom Severity for Boys and Girls Across Childhood
Einat Waizbard, Emilio Ferrer, Meghan Miller, Brianna Heath, Derek S. Andrews, Sally J. Rogers, Christine Wu Nordahl, Marjorie Solomon e David G. Amaral
Revista Autism – 1º de abril de 2025.
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Atualizada em 4/4/2025, às 10h
Texto: Marcus Vinicius dos Santos – jornalista CTMM Medicina UFMG