Está em avançada fase de pesquisa o uso da técnica de “eye tracking” combinada com inteligência artificial. Embora ainda não esteja disponível para diagnóstico, ela é mais promissora do que testes tradicionais
Um dos grandes objetivos das pesquisas em neurociência tem sido detectar doenças neurológicas e neurodegenerativas o mais cedo possível. De fato, uma verdadeira corrida contra o tempo.
Com toda a certeza, quanto mais rápido o tratamento for iniciado, maior a chance de melhorar a qualidade de vida de cada pessoa atingida. O problema se torna ainda mais urgente com o aumento da expectativa de vida das populações.
Estudos experimentais mostram que analisar o movimento dos olhos pode impactar a saúde pública. A técnica reduz custos e beneficia milhões de pessoas.
Em 2023, um artigo de pesquisadores de universidades japonesas, publicado na Frontiers in Psychology, revisou 38 pesquisas internacionais sobre o tema.
Os cientistas demonstraram que mudanças nos padrões do olhar surgem nas fases iniciais do comprometimento cognitivo leve (MCI). Por isso, o rastreamento ocular pode identificar esse comprometimento antes de surgirem sintomas graves.
Importante: esses testes ainda estão em fase de pesquisa e não podem ser usados na prática clínica.
Detectar cedo faz diferença
O comprometimento cognitivo leve (MCI), é uma condição intermediária entre envelhecimento normal e demência. Ele provoca alterações sutis na memória, atenção e funções executivas.
Os pacientes podem esquecer compromissos, ter dificuldade em lembrar nomes ou rotas, apresentar lentidão e perder o foco em tarefas complexas. Mas isso não impede totalmente a vida diária com qualidade.
O MCI reduz o desempenho esperado para a idade. Sem tratamento, pode evoluir rapidamente. E, mesmo que nem todos os casos se transformem em demência, a identificação precoce pode melhorar a qualidade de vida dessas pessoas.
Em outras palavras, a janela de oportunidade do diagnóstico precoce permite agir sobre fatores de risco modificáveis.
Medidas recomendadas incluem:
- Controle de hipertensão, diabetes tipo 2, colesterol alto e obesidade;
- Prática regular de exercícios físicos;
- Dieta equilibrada;
- Abandono do tabagismo e consumo excessivo de álcool;
- Estímulos mentais e vida social ativa.
Novas métricas e dispositivos portáteis
Um outro estudo, de 2025, publicado na Cognitive Systems Research, confirmou os achados anteriores e trouxe métricas adicionais. No entanto, desta vez, os autores são cientistas sediados na Índia Eles aplicaram modelos de aprendizado de máquina a dados de Eye Tracking.
Os modelos diferenciaram indivíduos saudáveis de portadores de declínio cognitivo leve com mais de 80% de sensibilidade. Por certo, é possível identificar não apenas a presença do declínio, mas também seu estágio. Por exemplo, o uso de dispositivos portáteis e mais baratos, capazes de realizar triagens em menos de cinco minutos. Isso permite levar a tecnologia a clínicas, unidades básicas de saúde e exames de rotina.
Porém, ambos os estudos ainda têm limitações. Amostras pequenas e ambientes controlados exigem novos testes com grupos maiores e culturalmente diversos. Além disso, é necessário padronizar métodos para evitar influências linguísticas e culturais.
Barreiras para uso nas clínicas
Apesar do potencial, decerto a maioria dos estudos envolveu amostras pequenas em ambientes controlados. Para uso clínico, é preciso:
- Ampliar testes para populações diversas;
- Padronizar protocolos, evitando distorções culturais ou linguísticas;
- Garantir sensibilidade e especificidade suficientes para reduzir falsos positivos e negativos;
- Tornar equipamentos e softwares acessíveis à atenção primária à saúde;
- Integrar Eye Tracking a exames neuropsicológicos e de imagem sem aumentar excessivamente os custos.
Benefícios e próximos passos
O mapeamento ocular (ou eye tracking) é não invasivo, portátil e mais acessível que exames tradicionais. Integrado à inteligência artificial, pode oferecer triagens rápidas e automáticas, reduzir internações e custos de longo prazo.
Apesar de todo este potencial, decerto ainda existem desafios. Protocolos precisam ser padronizados, e estudos maiores e mais diversos são necessários, antes da adoção na clínica.
Seja como for é bom destacar mais uma vez: não existe protocolo aprovado para diagnóstico de MCI em consultórios. Sobretudo, o eye tracking é usado quase exclusivamente em pesquisa, oftalmologia, neurologia e marketing. Em suma, validar a tecnologia em estudos amplos será decisivo para sua prática médica. O NeuroTec-R realiza pesquisa responsável nesse campo.
[Leia os artigos originais]
Eye-tracking paradigms for the assessment of mild cognitive impairment: a systematic review.
Wolf, A., Tripanpitak, K., Umeda, S., Otake-Matsuura, M. Frontiers in Psychology. 2023.
Eye tracking based detection of mild cognitive impairment: A review.
Hasnain Ali Shah, Salman Khalil, Sami Andberg, Anne M. Koivisto, Roman Bednarik. Cognitive Systems Research. 2025.
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Texto atualizado no dia 14/08/2025 às 16h
Texto: Marcus Vinicius dos Santos – jornalista CTMM Medicina UFMG