Notícia na Science alerta para controvérsias sobre riscos e benefícios em nova terapia para Alzheimer 

Esta foto ilustrativa mostra um modelo anatômico colorido do cérebro humano em primeiro plano. Ele está sendo segurado em frente ao peito de um profissional de saúde, sem mostrar o rosto da pessoa, que veste uniforme azul e porta um estetoscópio, no pescoço. Ele aponta para uma área específica do cérebro usando uma ferramenta metálica, destacando áreas de interesse neurológico.
A doença de Alzheimer afeta aproximadamente 1,76 milhão de brasileiros acima de 60 anos, e, nos EUA, cerca de 6,7 milhões de pessoas com mais de 65 anos. Esse cenário alarmante exige a busca por novas perspectivas para retardar o avanço dessa grave condição. Os monoclonais podem ser um marco importante nessa busca - Imagem gratuita Alzheimer Banque de photos par Vecteezy

A introdução recente de novos medicamentos baseados em anticorpos monoclonais para tratar o Alzheimer vem causando debate na comunidade médica e científica. Afinal, a doença de Alzheimer afeta milhões de pessoas em todo o mundo. Nos Estados Unidos a estimativa é de 6,7 milhões de pessoas com mais de 65 anos. No Brasil, são aproximadamente 1,76 milhão, acima de 60 anos. Isso representa entre 50% e 60% dos casos de demência no nosso país.

Diante desse cenário alarmante, os medicamentos monoclonais surgem como um marco promissor, oferecendo novas perspectivas para retardar o avanço dessa condição debilitante. Seu objetivo é remover o acúmulo de proteínas beta-amiloide no cérebro, a qual está associada à progressão dos sintomas do Alzheimer. 

No entanto, notícia publicada na revista Science, pela jornalista Jennifer Couzin-Frankel, na coluna de saúde, adverte para um dilema relevante: os benefícios terapêuticos dessa droga compensam os riscos associados? 

Visões contrastantes ressaltam incertezas

Em breves palavras, há incerteza sobre os benefícios de uso desses medicamentos, como o lecanemab e o donanemab. E a divergência é tão acentuada que centros médicos de renome nos Estados Unidos adotam posturas completamente diferentes sobre a prescrição desses medicamentos, avisa Cousin-Frankel.

A notícia relata que o neurologista Alberto Espay, do Centro Médico da Universidade de Cincinnati, se opõe ao uso dessas terapias em pacientes com Alzheimer. Acima de tudo, ele enfatiza que os riscos de efeitos adversos, como inchaço e sangramento no cérebro superam os benefícios, mínimos, segundo o cientista.  

E a Agência Europeia de Medicamentos (AME) parece concordar com ele. O lecanemab não teve seu uso autorizado na região de atuação da entidade

Por outro lado, Joy Snider, neurologista na Universidade de Washington, em St. Louis, pondera o uso. Segundo a pesquisadora, embora o efeito do lecanemab seja pequeno, ele é promissor. Neste hospital, já são cerca de 230 pessoas usando lecanemab. A escolha do medicamento se dá por conta de o donanemab ainda não estar adequadamente disponível, segundo a notícia. 

Resultados e desafios dos novos tratamentos

Ambos os anticorpos monoclonais foram aprovados pela FDA (Food and Drug Administration), dos EUA. “Lecanemab, comercializado pela Biogen e Eisai, obteve aprovação total da Food and Drug Administration, dos EUA, em julho de 2023; Donanemab, da Eli Lilly, recebeu sinal verde um ano depois”. Os resultados do donanemab estão publicados no Journal of the American Medical Association (JAMA)

Do estudo relatado na Science participaram 1.736 pacientes, com idades entre 60 e 85 anos, de oito países. Todos apresentavam diferentes níveis de acúmulo das proteínas beta-amiloide e tau no cérebro, além de comprometimento cognitivo leve.

Em fases iniciais da doença, estudos clínicos mostraram que os monoclonais poderiam desacelerar o declínio cognitivo entre 25% e 30% ao longo de 18 meses. E isso seria uma melhora enorme. 

Contudo, quase 37% dos participantes nos testes apresentaram efeitos colaterais significativos, como inchaço cerebral (ARIA) e sangramento. Principalmente em portadores do gene APOE4, que aumenta o risco de a pessoa desenvolver a doença de Alzheimer. 

Pacientes devem fazer teste genético APOE

Os riscos e a eficácia dos tratamentos têm gerado divergências também em órgãos reguladores internacionais: enquanto países como Japão, Coreia do Sul e Reino Unido aprovaram a terapia, outros, como a Austrália e a União Europeia, recusaram a autorização.

Michael Greicius, neurologista de Stanford, questiona o efeito dos anticorpos monoclonais nos testes, sugerindo que os pacientes que apresentaram sintomas de ARIA podiam identificar que estavam recebendo a medicação ativa, o que poderia enviesar os resultados. 

Outra referência no tratamento de Alzheimer, o neurologista Vijay Ramanan, da Clínica Mayo, nos EUA, defende que, desde que os pacientes estejam cientes dos riscos, a decisão de iniciar o tratamento pode ser deixada para eles. Contudo, sempre com supervisão médica rigorosa e testes genéticos prévios, para verificar a presença do gene APOE4, adverte Ramanan.

Perspectivas futuras e controvérsias éticas

Joy Snider observa que os ensaios clínicos envolviam apenas pacientes altamente saudáveis, enquanto a realidade inclui pessoas com múltiplas comorbidades. Segundo ela, isso aumenta a complexidade das decisões de prescrição. 

A introdução desses tratamentos levanta questões mais amplas sobre a prática clínica e as melhores formas de aplicar os avanços científicos em terapias experimentais. Por outro lado, a falta de dados sobre o impacto de tratamentos a longo prazo também preocupa os médicos. Seja como for, até o momento não há evidências de benefícios após os 18 meses.

À medida que médicos e pesquisadores lidam com as incertezas da nova terapia, a pergunta persiste: os benefícios da redução da beta-amiloide no cérebro compensam os riscos de ARIA e outras complicações? A discussão persiste.

Segundo a NHS England, 27 outras drogas dirigidas a tratar Alzheimer estão atualmente em ensaios clínicos avançados naquela instituição. A previsão é de que esses novos fármacos têm a possibilidade de serem aprovados até 2030.

Resumindo…

Anticorpos monoclonais: Benefícios e riscos 
AspectoFavoráveis ao tratamentoContrários ao tratamento
MedicamentosLecanemab e DonanemabLecanemab e Donanemab
ObjetivoReduzir beta-amiloide no cérebro e desacelerar a progressão do AlzheimerQuestionar se essa redução efetivamente beneficia os pacientes
Resultados clínicosEstudos mostram desaceleração de 25-30% no declínio cognitivo em casos iniciaisEficácia limitada, com efeito pequeno para justificar os riscos em muitos casos
Riscos e efeitos colateraisRiscos aceitos, desde que o paciente e a equipe estejam informados (risco de ARIA)Risco elevado de ARIA (inchaço e sangramento cerebral), especialmente em portadores do gene APOE4 e usuários de anticoagulantes
Posição sobre PrescriçãoPrescrever para pacientes com Alzheimer leve, com orientação sobre riscosPreferência por evitar a prescrição, citando risco maior que os benefícios para muitos pacientes
Apoio de órgãos reguladoresAprovado nos EUA e vários países (ex.: Japão, Coreia do Sul)Recusado na União Europeia e na Austrália
Preocupações éticasBenefício potencial justifica o uso em pacientes informadosDesconhecimento sobre efeitos a longo prazo e possibilidade de falsas esperanças
Comentários de especialistasJoy Snider (Washington University) considera os efeitos pequenos, mas promissoresAlberto Espay (Univ. Cincinnati) considera os benefícios mínimos e os riscos elevados

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