Mobilidade e cuidado no Alzheimer; andar é mais do que apenas se mover 

Mobilidade e cuidado no Alzheimer
Caminhadas e outros exercícios físicos simples ajudam pessoas com demência a preservar mobilidade e reduzir dependência da família - Foto de Freepik.com

A reabilitação das pessoas demência é tão central para a sua qualidade de vida que a gente resolveu falar mais um pouquinho do Relatório global da ADI. Cuidadores e o apoio do máximo possível de familiares são partes da solução para uma vida com mais independência e felicidade. Vem ver…


A mobilidade é um dos quatro pilares da reabilitação em demência, ao lado de cognição, comunicação e atividades da vida diária. No entanto, histórias de idosos em fase inicial de demência e que perdem a independência são comuns. Em alguns meses a família pode perceber que seu ente já não quer mais sair de casa. Tem medo de cair, por exemplo, ou por outra causa. Mas, cada vez que se evita caminhar ou subir degraus, um pouco da independência vai-se embora.

O World Alzheimer Report 2025, lançado em setembro pela Alzheimer’s Disease International (ADI), dá destaque a este ponto de vista. A publicação também alerta: perder mobilidade acelera a dependência e, consequentemente, aumenta a sobrecarga da família ou de cuidadores profissionais.

O que significa “parcela de mobilidade”

Então, a gente precisa ter em mente que se mover é importante. A “parcela de mobilidade” inclui tudo o que ajuda a pessoa com demência a continuar se movimentando com segurança. E isso vai desde a prática de exercícios de equilíbrio e força até a adaptação do ambiente onde o idoso vive, para se tentar evitar quedas a todo custo. 

Quanto mais tempo a pessoa se mantém ativa, maior a chance de preservar autonomia e autoestima. Claro que devemos nos sentar e descansar. Não se trata disso. Mas é preciso evitar aquela imagem do “velhinho” que fica sentado o dia todo. Aliás, mesmo os jovens devem evitar o sedentarismo. 

Há estudos mostrando que sentar oferece riscos também para quem não tem o diagnóstico da doença. E mesmo para quem pratica exercícios físicos regularmente. Como forma de prevenção da doença, caminhar pode ser um santo remédio. Estudos mostram que dar mais passos ao longo do dia pode ser uma das intervenções de saúde mais simples e poderosas. Também há pesquisas mostrando que muitas horas do dia sentado durante o dia aumenta o risco de neurodegeneração.

Segundo os artigos da ADI, a reabilitação focada na mobilidade pode adiar a institucionalização em até 18 meses, além de reduzir hospitalizações relacionadas a quedas. Caminhar diariamente, em grupo, se possível, ou usar objetos simples da casa para exercícios já faz uma grande diferença na qualidade de vida de todo idoso. De uma maneira muito especial para o idoso com a doença de Alzheimer.

Cuidador é co-terapeuta

E os cuidadores? Familiares ou profissionais, eles não são apenas “acompanhantes”. Longe disso. O papel do cuidador é o de um co-terapeuta. Sua ação ativa e devidamente orientada tem uma importância central no processo de reabilitação das pessoas com alguma demência. 

São eles quem supervisionam as caminhadas, adaptam móveis, estimulam exercícios simples e encorajam a pessoa a se manter confiante. Além disso, o cuidador precisa ser capacitado sobre como agir em caso de queda de seu assistido, dentre outros procedimentos de urgência e emergência.

No entanto, quem cuida de doentes crônicos fica exposto a um estresse diário muito alto, e também precisam ser mais bem cuidados.

A ADI também recomenda criar planos duplos de metas. Mas, o que isso significa? Que é preciso estabelecer objetivos para a pessoa com demência e, também, para os seus cuidadores. Afinal, quem cuida também precisa de apoio e descanso para não adoecer. Grupos de apoio e serviços de “respiro” (respite care) são mencionados como recursos eficazes para aliviar a sobrecarga.

E a família no dia a dia?

Nem todo familiar é cuidador principal, mas todos podem ajudar. 

É muito bom quando os outros parentes podem participar de caminhadas, em determinados dias da semana, por exemplo. Ou que se ofereçam para ajudar no transporte para consultas, dividam tarefas domésticas ou simplesmente acompanhem a pessoa em atividades sociais. Uma maior divisão de tarefas de cuidado com o idoso evita sobrecarregar apenas uma pessoa e mantém o idoso mais engajado.

Além disso, é muito positivo quando os familiares podem integrar grupos comunitários, fortalecendo redes de apoio locais. Quanto mais pessoas envolvidas, maior a chance de manter “mobilidade” e “qualidade de vida”.

E quem não tem acesso a certos serviços ?

O documento reconhece desigualdades de acesso. Existe no mundo todo. Mas, as famílias que não conseguem oferecer atendimento especializado são orientadas a buscar soluções de baixo custo

Não é preciso esperar por um profissional de fisioterapeuta ou de terapia ocupacional para começar a reabilitação.

Além das caminhadas, exercícios de alongamento, treinos de equilíbrio usando cadeiras ou garrafas de água como peso, e a prática de atividades em grupos comunitários, são alguns exemplos práticos. Mas, pequenas mudanças no cotidiano — como incluir atividades prazerosas, jardinagem ou dança em casa — já contam para uma melhor qualidade de vida para o paciente.

O artigo dos pesquisadores brasileiros defende a reabilitação centrada na pessoa como parte essencial do cuidado em demência. “Ao devolver autonomia ao paciente e apoiar os cuidadores, a intervenção melhora a qualidade de vida”, afirmam os autores Isabel Cristina de Resende, Maria Aparecida Camargos Bicalho e Bernardo de Mattos Viana

Pesquisadores do Programa de Extensão em Psiquiatria e Psicologia do Idoso (PROEPSI-UFMG ) e do projeto Cog-Aging da Faculdade de Medicina da UFMG, os autores também defendem o fortalecimento de vínculos familiares. Além do impacto social e humano dessas ações, os especialistas destacam a redução de custos indiretos para o sistema de saúde, algo igualmente importante para famílias de baixa renda. 

Por que mobilidade é central

Mobilidade aparece lado a lado com cognição, comunicação e vida diária porque está diretamente ligada à dignidade. Sem ela, a pessoa com demência perde papéis sociais, aumenta o risco de depressão e acelera a dependência.

É por isso que a ADI defende que planos de reabilitação precisam incluir metas claras de mobilidade, revisadas regularmente. Esse cuidado não apenas previne quedas e internações, mas preserva identidade e qualidade de vida.

Caminhar é resistir

O World Alzheimer Report 2025 mostra que andar, subir degraus ou cuidar do jardim são mais que simples movimentos. São atos de resistência contra a progressão da demência. Para que isso aconteça, cuidadores, familiares, profissionais de saúde e comunidades precisam caminhar juntos.

A campanha global #AskAboutDementia e #AskAboutAlzheimers reforça a mensagem: falar sobre reabilitação é tão importante quanto aplicá-la. Afinal, mobilidade não é apenas parte da saúde física — é o que mantém a vida em movimento. Você tem alguma dúvida a respeito da doença de Alzheimer? Manda sua dúvida para nós pelo @inctneurotecr.

[Leia o relatório completo]

World Alzheimer Report 2025
Reimagining life with dementia – the power of rehabilitation (Em inglês)
Alzheimer’s Disease International. Londres: ADI, 2025.

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Texto: Marcus Vinicius dos Santos – jornalista CTMM Medicina UFMG